Read about Exaudio event at The Yeatman in English

O Porto acordou no passado fim de semana com o clima que sempre o caracteriza no mês de novembro: húmido, cinzento e envolto naquele nevoeiro que parece guardar segredos. Ao chegar ao Yeatman, hotel pousado na encosta de Vila Nova de Gaia sobre o rio Douro, com a elegância tranquila de quem sabe o privilégio da vista que oferece sobre a zona ribeirinha do Porto, percebia-se que o fim de semana prometia.

O Yeatman tem esta qualidade romântica e cenográfica: cada canto, cada vinco de luz, amplifica e ao mesmo tempo protege o que lá acontece. E foi precisamente essa aura que se fez sentir quando a Exaudio trouxe ao Norte mais um evento áudio, num ritual que teve tanto de exclusivo como de acolhedor.
Sala ATC / Bricasti / Audio Note


Ao entrar na primeira sala, instalou-se a expectativa que só se sente diante de uma das marcas britânicas mais icónicas, a ATC. Perante mim, um sistema construído em torno das ATC SCM40A. Com este par de colunas viajou o subwoofer da mesma marca, o C1. As colunas, ativas, acabadinhas de sair da caixa. A aquecerem, mas já a revelarem o que se comprometem saber fazer: neutras, transparentes e controladas; agudos abertos; médios limpos, articulados e carnudos; graves já a caminho da firmeza definitiva que prometem atingir após rodagem; e um palco sonoro realista, iluminado e coerente.
O pré-amplificador Bricasti M20 acrescentou o refinamento musical, que reencontrei também no DAC M3 (cuja review publicarei nos próximos dias). O transporte de CDs Audio Note CDT Two/II, juntou o seu caráter orgânico, e a organização e silêncio do streamer Lumin T3x , marca agora representada em Portugal pelo organizador deste evento, completavam um front-end digital competente, equilibrado e de grande maturidade sonora.
No domínio analógico, a precisão musical do giradiscos EMT 928, com o andar de phono 128, e a célula JSM Pure Black da marca, e o braço Thales Simplicity II, erguiam um verdadeiro santuário de presença, textura e realismo: um reencontro depois do relato que dediquei à sua apresentação em Portugal.

Segunda sala: a pronúncia da TAD, da Avid, da Lumin


A segunda sala revelava um sistema de filosofia distinta: front-end analógico com gira-discos Avid Acutus Dark Iron, andar de phono Pulsare II do mesmo fabricante britânico, e célula Shelter Harmony. No digital, o streamer Lumin U2, com conversão a cargo do leitor de SACD/DAC D 1000tx, a amplificação com o prévio C 1000 e o power stereo M 1000, com as colunas de chão E1Tx, todos da mesma marca nipónica, reforçavam uma assinatura sonora musculada, controlada e incisiva, que me remeteu de imediato para a análise que havia feito deste sistema, impressões reforçadas pelas declarações do presidente da companhia, Shinji Tarutani, em entrevista exclusiva concedida à equipa MoustachesToys.
O som? Preciso, rápido e transparente, com enorme autoridade, dinâmica, agudos extensos e arejados e um palco tridimensional e estável. Foi particularmente interessante revisitar esta plataforma, desta vez alimentada pelo Lumin, cuja assinatura reforçou a clareza, coerência e o sentido de organização espacial que caracterizam a TAD. A diferença principal para as experiências anteriores com estas máquinas? Sobretudo a sala diferente! Mas também, quem sabe?, a introdução a toda a linha neste sistema, da gama de cabos Zorro, da ZenSati, que se confirmou como uma montra, de maior transparência entre máquinas. No meu gosto pessoal, e admitindo que isso faz sempre parte da equação, preferi a assinatura sonora da sala anterior, mas reconheço sem dúvida, o maior refinamento desta sala.
1812: streaming versus SACD

Um dos momentos altos do evento foi a audição da abertura de 1812 de Tchaikovsky. Primeiro na minha forma de reprodução sempre preferida em streaming, com Qobuz Connect; depois em SACD, no mesmo sistema. E não há forma de suavizar: o formato físico arrasou! Mais profundidade, mais textura, mais microdinâmica: mais informação, logo, mais verdade.
A potência orquestral, em toda a largura do espectro, revelou no SACD pormenores, contrastes e camadas de profundidade que simplesmente não se manifestaram com a mesma clareza na versão em streaming.
Uma presença importante pelo seu significado
Quem me acompanha sabe que, seja na zona do Porto ou na de Lisboa, seja em Viseu, ou nas profundezas do país, em Carregal do Sal, ou onde quer que a alta-fidelidade aconteça em Portugal, desde que iniciei esta carreira de relatar o que vivo e ouço deste mundo ao áudio, tenho sido o único órgão de comunicação desta área a marcar presença, doa o que doer em quilómetros. Desta vez, porém, o destino sorriu: o Yeatman fica a apenas 20 km de minha casa.
Resultado? Estive presente todos os dias: sexta, sábado e domingo. O que me permitiu construir uma visão muito mais abrangente e aprofundada das salas, das variações e daqueles instantes que só se revelam com tempo e repetição.
Ainda assim, importa sublinhar, e aplaudir, a deslocação do HiFiClube ao Norte para também cobrir este encontro. Em Portugal, país pequeno em dimensão, mas ainda menor em apoios a quem o calcorreia para relatar aos outros o que vive e ouve nos raros eventos de Alta-Fidelidade, estas presenças contam verdadeiramente.
E talvez seja aqui que se compreenda melhor uma outra realidade: porque razão, hoje, algumas marcas se destacam de forma tão clara no coração dos audiófilos portugueses. Não apenas pela paixão evidente no que fazem, mas porque continuam a demonstrar disponibilidade também para fazer quilómetros, marcar presença e estar onde há som para ouvir e discutir.

A fidelidade, também a humana, constrói-se assim.
Saio do Yeatman com a sensação de que o áudio high-end é isto mesmo

Não é só técnica.
Não são apenas especificações.
Nem apenas nomes icónicos.
É ambiente. É contexto.
É a soma de paixão, rigor e partilha.
No Yeatman, tudo pareceu soar a música. Talvez seja magia, talvez seja apenas o Norte a fazer o que faz tão bem: acolher.

Pingback: Exaudio at The Yeatman, Year One - MoustachesToys | High-End Audio Reviews & Experiences
Os comentários estão fechados.