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Certo dia, num evento áudio, perguntaram-me por que não faço reviews técnicas. Acho que encontrei a resposta perfeita. Onde está, no próximo parágrafo, a explicação para este amplificador encher a minha sala de música desta forma? Onde se esconde o segredo para a música mexer tanto comigo desde o instante em que o liguei pela primeira vez? Desde o quilómetro zero, saído da caixa, ainda a cheirar a novo?
As Especificações Técnicas
- Amplificador integrado balanceado
- Potência: 90 W/8 ohms e 120 W/4 ohms
- Resposta em frequência: 3 Hz – 150 kHz
- Distorção harmónica total (THD): 0,05% (4 a 16 ohms)
- Relação sinal/ruído (S/N Ratio): até 122 dB
- Controlo de volume: AAVA (Accuphase Analog Vari-Gain Amplifier)
- Etapa de amplificação: 2 transístores bipolares em configuração push-pull paralelo duplo por canal
- Etapa de saída: realimentação de corrente de baixa impedância, garantindo um fator de amortecimento de 500
- Transformador: toroidal sobredimensionado e condensadores de alta capacidade
- Seleção de sinal: através de relés controlados logicamente
- Circuito de proteção: MOS-FETs de resistência ultrabaixa
- Funções: controlo de tons (com bypass opcional), equilíbrio de canais, seleção de fase por entrada, modo monofónico, compensador loudness e atenuação instantânea (-20 dB)
- Amplificador dedicado para auscultadores
- Medidores analógicos de potência de pico
- Pré e potência independentes (entradas RCA, saídas pré RCA)
- Conectividade:
- 1 entrada L/R XLR balanceada
- 5 entradas L/R RCA não balanceadas
- Entrada/saída L/R para gravador
- Terminais duplos para altifalantes (A/B/A+B)
- Expansibilidade: 2 slots para placas opcionais Accuphase (phono MC/MM, DAC, ou linha)
- Dimensões: 465 mm x 151 mm x 420 mm
- Peso: 20,4 kg
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Agora, vamos ao que realmente importa!
A Alma do Granito
Dizem que a primeira impressão é a que fica. A minha primeira experiência documentada com a Accuphase aconteceu no Hotel Sheraton, durante as Ultimate Sessions Extreme no Porto. Ainda dava os primeiros passos como comunicador na alta-fidelidade quando entrei na sala onde as Audiovector R8 Arreté brilhavam, alimentadas por um conjunto de monoblocos, prévio e leitor de CD/SACD da marca japonesa.
À primeira vista, o estilo contido da Accuphase parecia deslocado num evento onde todos os equipamentos esbracejavam por atenção. No entanto, aquela foi a segunda sala com mais público – só superada por outra muito maior, que exibia a impressionante simbiose entre os topos de gama da Avantgarde com amplificação Kondo Ongaku, para alguns, os melhores amplificadores do mundo.

Mais tarde, num sistema com colunas full-range Cube Audio e um amplificador single-ended da Tektron, alimentados pelo DAC interno de um leitor de CDs da Accuphase. Tão simples como isso. Revelou-me, desta vez sem distrações, o lado musical e emocional da marca. E mais recentemente, cruzei-me com o E-380 que, mesmo sucedendo ao monumental – e muito mais caro – Gryphon Diablo 333 no mesmo sistema, não deixou de me impressionar.
A Accuphase não interrompe os outros, não grita por atenção. Impressiona pela consistência e eficiência – como Cristiano Ronaldo no seu auge. Mas, acima de tudo, impressiona pela musicalidade. Aos poucos, sem alarido, o “bichinho” foi crescendo dentro de mim.
A história da Accuphase é como o granito: sólida, resistente e fiável. Quem compra um Accuphase raramente muda. E, quando o faz, normalmente fá-lo para subir na hierarquia da própria marca. Está gravado a escopro na pedra – e começa a ficar na minha alma.
O E-280 na Torre Bigodes

O E-280 é o amplificador integrado mais acessível da Accuphase – mas acessível não significa barato. €5.750 pode parecer muito, mas trata-se da porta de entrada no universo high-end.
Esteticamente, mantém a identidade visual da marca: painel frontal dourado, vuímetros centrais em fundo preto e dois botões circulares laterais. A utilização? Buttery smooth! Cada botão e seletor é um exemplo da precisão japonesa.
Desde que chegou à Torre Bigodes, comparei-o com várias soluções:
- NAD C658 + C298 (pré e power) Review aqui em breve
- Marantz M1 (tudo-em-um) review aqui em breve
- TEAC UD-701N + AP-701 (pré e power) review aqui em breve
- Pier Audio MS-480SE (híbrido) review aqui
- Pier Audio MS-84SE (válvulas) review aqui em breve
Quando o Accuphase chegou, ainda por cá pairava o requintado perfume sonoro do recentemente devolvido à procedência Audio Note Cobra. Os cabos de interconexão foram os da Accuphase fornecidos pela marca e os Chord C-Line e ClearwayX.
E as fontes?:

Do lado analógico, ainda por cá andava o giradiscos que foi a referência nos últimos dois anos, o MoFi StudioDeck, bem como o Avid Ingenium (review aqui em breve), testado com dois pratos diferentes, ambos maciços, (também no peso. Um em MDF e outro em alumínio).
No digital, passei por três modos:

- Streaming descomprometido (Utilizei Apple Music com um painel de 58 polegadas a exibir as capas dos discos e as letras das músicas, ligando-o via entrada ótica primeiro ao UD-701N, e depois ao DAC interno do leitor de CDs Accuphase DP-450, review aqui em breve)
- CD como fonte primária (com o DP-450)
- Streaming de nível audiófilo (Silent Power LAN iPurifier Pro (review aqui em breve) e Volumio Rivo (review aqui em breve) como transporte digital para o excelente DAC do DP-450 via USB, utilizando Qobuz através do Roon)
As colunas?
As Revival Atalante 3 (review aqui em breve), que criaram uma sinergia mágica com o E-280 na minha sala de apenas 25m². Também passaram por cá as omnidirecionais Duevel Planets, e as mais evoluidas Enterprise (review aqui em breve), bem como as full-range de fabrico nacional (na ilha do Faial) Azoric Audio Corvo (review aqui em breve). Os cabos de coluna utilizados foram os Ansuz Speakz X2.
Não faltaram cenários para testar este integrado, não?
Uma das minhas dificuldades como comunicador part-time é ter horários de audição incompatíveis com o descanso dos meus vizinhos. A combinação entre E-280 + Revival 3 foi uma agradabilíssima surpresa e ajuda. Dei por mim a ouvir música à noite a -60dB e menos, com a mesma clareza e insight que outros sistemas que passaram por cá e só ofereceram a mesma qualidade a volumes proibidos por lei depois das 22h num prédio com treze apartamentos. O responsável? Suspeito que o seletor de volume AAVA da Accuphase.

O Som do E-280
Mesmo para um reviewer, ouvir música não tem de ser um exercício técnico; é, acima de tudo, uma experiência humana. Largura e profundidade do palco, foco dos instrumentos, textura, rapidez – tudo isso importa. Mas ouvir música é, acima de tudo, um ato que nos complementa e caracteriza como seres humanos.
Sempre que tentava tirar notas sobre o E-280, dava por mim simplesmente a ouvir e a desfrutar da música e a esquecer-me das minhas obrigações. Não há maior elogio a fazer a um amplificador. Este aparelho distrai-nos de tudo o que não seja a experiência musical.
Vítor, concentra-te!
É chegado o momento de trabalhar. Respira. E ouço respirar sim: Carlos Paredes, por entre o Movimento Perpétuo das notas da sua Guitarra com Gente Dentro. A Música de Paredes tocou-me. Não vou aqui proclamar que foi com o Accuphase a primeira vez. Não, não foi. Mas desta vez tocou mais fundo, como se Carlos Paredes se tivesse materializado e ressuscitado na minha sala. Revitalizado e com vontade acrescida de me levar nas Asas Sobre o Mundo.

Continuei com a guitarra portuguesa. Amália Rodrigues. E com que voz cantou!:
“Com que voz, chorarei o meu triste fado,
que em tão dura paixão me sepultou.”
O caráter orgânico do som do E-280 casou com as bolachas pretas como se tivesse sido feito a pensar especificamente no vinil.

Jean-Michel Jarre nos “Concertos na China“, em 1981. Como se terá sentido um chinês ou chinesa, acabado de chegar de bicicleta ao recinto do concerto, ouvir “Arpegiator” tocado a laser, num concerto de um ocidental pela primeira vez, no ainda gigante adormecido? E porque será que me ponho a pensar nestas questões? A música faz-nos disparar substâncias químicas várias. Se a experiência musical for sentida de certa forma mais intensa, os efeitos conexos serão mais extensos? Fica a pergunta.
O mistério das vozes do Coro Feminino da Rádio e Televisão Estatal Búlgara permanece indecifrável, mesmo para o poder analítico do Accuphase. As vozes pairam pela sala como espectros sonoros, materializadas pelo E-280, transportando-nos para uma dimensão paralela onde o tempo e o espaço se desvanecem. “Yulunga”, – Dead can Dance, com o ritmo da percussão e a voz de Lisa Gerrard a induzir a sala de audição em modo rito tribal.
Recordo-me da mítica audição com o irmão mais crescido deste amplificador, o E-380, acompanhado pelo DAC Galle, que temperou a música com sabor a canela. Foi nessa sessão que “Wild Horses” dos Rolling Stones me arrebatou, levando-me a experimentar o mesmo tema na minha sala, agora com o E-280. Apesar da minha regra pessoal de não revisitar momentos em que fui feliz, fi-lo. E se os Stones, num primeiro momento, rejeitaram esta canção, eu não poderia descartá-la. A experiência foi mais uma vez de um conforto estranho, mas profundamente reconfortante.

Portugal, décadas de 80 e 90. Hinos do rock e pop nacional, como “Porto Sentido”, “Aquele Inverno”, “Num Filme Sempre Pop”, “Sol da Caparica”, “Noutro Lugar”, “Remar Remar” e “O Elevador da Glória”, alguns deles registados sem grande preocupação com os “empertigados” audíófilos, ganham de novo vida com o Accuphase. Que aceita os seus defeitos como um avô aos seus netos. A musicalidade deste amplificador permite que perdoemos gravações imperfeitas, porque o que realmente importa é a música.
No jazz, vozes icónicas como as de Ella Fitzgerald e Billie Holiday transcendem as limitações tecnológicas das suas gravações para se apresentarem com uma elegância e um calor envolvente. Já na clássica, com obras de alta complexidade como a 4ª Sinfonia de Shostakovich, tudo surge com lógica e organização, sem nunca perder a compostura, mesmo nos trechos mais complexos. O violoncelo de Vincent Bélanger na Suite nº1 de J. S. Bach segue fielmente a interpretação e composição, proporcionando uma experiência de audição imersiva e emocional. Sempre a música pela música. Apresentada como parte de nós, e de que nos sentimos parte.

Este amplificador não se limita a reproduzir música. Ele transporta-nos por paisagens sonoras, desde o “Sol da Caparica” dos Peste & SIDA até ao dueto de “Lakmé” de Delibes. Como em “Com que voz”, que nos leva pela melancolia e inevitabilidade da dor, independentemente de ser interpretada por Amália Rodrigues, Camané ou Maja Milinković, o Accuphase E-280 não é apenas um amplificador. É um contador de histórias sonoras, um catalisador de emoções e um companheiro fiel na viagem pela música. E estou a chegar à conclusão de que este sim, este veio para ficar!
Accuphase E-280 disponível aqui
Pode ver onde encontrar os outros equipamentos presentes neste teste aqui
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