Quem era adolescente quando saiu “Smells like Teen Spirit”? Eu fiz 16 anos em 1991, o ano em que a música foi lançada, e na época, não havia músculo meu que não pulsasse ao ritmo dos acordes do primeiro sucesso global dos Nirvana.
O Grunge 30 anos depois, Naim NAIT 50 + Focal Vestia Nº1
Com o passar dos anos, a reação física a estes sons foi abrandando, até ao atual estado das coisas em que me limito a juntar mãos, como se estivesse a rezar, sentado, parado, num dos ângulos de um triângulo equilátero formado entre mim e as colunas, em posição medida e calculada para estar o mais no centro possível do palco sonoro tridimensional e nuances que o equipamento de reprodução for capaz de reproduzir.
Este foi o panorama pelo menos até há alguns dias atrás, quando chegou a minha casa este amplificador pouco menor que o tamanho de uma caixa de sapatos.
O sistema de que estou a falar e onde este amplificador está integrado foi cedido pela Esotérico para review, constituido pelas novas colunas monitoras Vestia Nº1da Focal, com suportes próprios incluídos, o amplificador Naim Nait 50 e o leitor de CDs Naim CD5si.
Para as minhas costas cansadas e usadas de quase 50 anos, montar um sistema completo de uma assentada, incluindo pés de colunas, posso-vos dizer que é dose de cavalo.
Mal acabei de o montar, liguei-lhe o DAC residente, e começou a tocar uma lista daquelas que o algoritmo escolhe por nós. Aos primeiros acordes de “Smells like..”, dei por mim a desafiar o garfo que tenho espetado nas costas, a abanar o capacete. Como já não me lembrava da última vez.
Mas que efeito estranho foi este?!
Calma! Comecemos pelos números:
As colunas – Focal Vestia Nº1:
- Monitoras de 2 vias com woofer em slatefibre, com 16,5cm e pórtico frontal
- Tweeter em T.A.M., de cúpula invertida, com 25mm
- Sensibilidade? 89,5 dB
- Impedância nominal? 8 Ω, mínima de 4,5 Ω
- Potência do amplificador recomendada? 25 a 120 Watts
- Crossover aos 2,8Mhz
- Amplitude? 56hz até 30Khz (+/-3dB)
- Peso (questão mais importante que muitos pensam) de 17,5 kg (o par)
- Os pés de 55 cm de altura (não incluídos), inclinados para trás para alinhamento temporal. o preço de 100€ torna a compra em conjunto com as colunas obrigatória, não só mas também pelo acréscimo na qualidade do som. Depois de as ouvir com os pés, o som já não parecia natural sem eles. Quem o fizer, aconselho a usar as colunas aparafusadas aos pés. Se tiverem animais ou crianças em casa principalmente. Eu tenho 2 animais e 3 crianças, logo 5 motivos para não arriscar devolver as colunas estragadas à Esotérico.
O leitor de CDs – Naim CD5si
- Mecanismo de gaveta manual com “puck” magnético para estabilização do disco (onde é que já isto? Em leitores de valor várias vezes superior).
- Saídas RCA e DIN (liguei-o ao amplificador usando cabos com terminações DIN, como mandam as regras Naim)
O amplificador integrado – Naim Nait 50
- Lançado para celebrar os 50 anos do fabricante
- (Supostamente) colocadas 1973 (ano da fundação) unidades no mercado. (Por estas e por outras, mas principalmente pelas outras, este Naim esteve a uma unha negra de ficar cá em casa)
- Forma? clonada quase na perfeição do integrado agora com 40 anos, o primeiro da marca, o Nait 1. O botão de balance foi substituído pela saída jack 6,35mm, e o LED passou de verde para branco.
- 25 Watts a 8 Ohms. …. …. Espera! Say What?!
Este amplificador foi uma surpresa, e o próximo que vier discutir seja o que for relacionado com som usando números como argumentos, então recomendo uma audição com o Naim Nait 50.
O que não será surpresa é a confiança do fabricante ao divulgar a sua potência a 4 e 2 Ω.
- 40 Watts a 4 Ω e 60 Watts a 2 Ω
Mais números para quem gosta dessas coisas:
A minha sala tem cerca de 25 metros quadrados. As Focal cantaram com o amplificador ligado ao DAC com picos de 85dB com o botão de volume nas 9/9H15. As Triangle Borea tocaram ainda mais alto (têm maior sensibilidade nominal). Tendo como fonte o leitor CD5si, o volume baixou cerca de 2 a 3dB.
Mais importante que qualquer número: este sistema devolveu-me a alegria de ouvir música. Passo a explicar.
Nas minhas aventuras no reino da audiofilia, e pelo High-end áudio, dei por mim a ouvir música quase exclusivamente de forma critica, e analítica. A ouvir máquinas, não música.
Estaria a perder o contacto com o que realmente interessa? Na minha opinião. Com certeza que sim!
Fiquei com essa noção exata quando desliguei e devolvi a grande parte do material que tive cedido em casa, antes de ir de férias na última semana de julho. Quando voltei, e o único material audiófilo que ficou montado foram os dispositivos de control de ressonância que tenho colocados por baixo das colunas e de que já não abro mão. Com as minhas monitoras de 450€, DAC chinês e sistema Pioneer com mais de trinta anos, a experiência de ouvir música foi tão satisfatória como antes de me envolver no mundo audiófilo, quando era a música que importava.
Estaria a desistir da audiofilia? Já lá vamos.
Entretanto chega o conjunto Focal e Naim. Imediatamente voltou o entusiasmo!
De que forma? ouvi “Midnight Sun” de Nilüfer Yanya sem escrutinar a textura do baixo, ou as nuances de cada som, mas apenas a “curtir” “Midnight Sun” de Nilüfer Yanya. E quem diz esta, outra, e a seguinte, e a seguir a essa, e por aí fora…
PRaT – Cadência, Ritmo e Timing é a tradução possível da expressão inglesa. “Timing” em português pode ser traduzida como “tempo” ou “momento.”
Indo diretamente ao assunto (já me começam a conhecer): Este amplificador fez-me ponderar se este seria o momento de me juntar à comunidade Naim, tal a forma como o seu som se apoderou de mim.
Num artigo recente, apelidei os fãs da marca de Salisbury de “seita”. Fãs porque, de fora, parece haver um toque de fanatismo. Falei com Alberto Silva, da Esotérico, sobre como as pessoas que compram Naim se “fecham” na marca. Alberto esclareceu que de facto existem uma série de detalhes que distinguem o fabricante britânico de todas as outras, alguns insignificantes, outros nem tanto, que tendem a fidelizar quem entra no mundo Naim. A insistência nas tomadas DIN, em vez das mais amplamente aceites RCA e XLR. A gaveta do leitor de CDs que é manual e se abre em compasso. A tomada IEC em que a ficha do cabo de corrente não entra totalmente e nos deixa na dúvida se está tudo no sítio, as tomadas para os cabos de colunas colocadas ao contrário de todos os outros fabricantes, etc, etc, etc. todos esses detalhes e pequenas diferenças são devidamente justificados pelo fabricante com algum ganho por ser assim, e não de outra forma.
Mais o mais importante. Aquilo que realmente, realmente diferencia este amplificador dos que tenho ouvido no último ano, período de tempo em que passei a ser “oficialmente” um audiófilo, será o seu caráter e qualidade de condução rítmica. Pace Rhythm and Timing é, sem dúvida, uma característica que distingue a Naim, e foi a primeira sensação que este amplificador passou, mal o liguei pela primeira vez. Será por isso que quem conhece bem a marca, se torna embaixador, embaixador do fator diversão, que vem de série com estes equipamentos. Fica a curiosidade de conhecer outros amplificadores e streamers da marca.
Este pequeno amplificador é um monstro de resolução e controlo, e fá-lo com a capacidade de nos dar uma perceção nítida da música sem perder os pontos que ligam cada “átomo musical” e dão a lógica e continuidade à música. O Naim Nait 50 oferece um impacto sonoro muito superior ao que o seu tamanho faria prever.
Este ímpeto é de tal ordem, que quem viver num apartamento como eu, prepare os instrumentos de precisão para rodar o botão de volume. Qualquer movimento menos que delicado, e logo teremos os vizinhos a bater à porta durante as audições noturnas.
O descanso dos meus vizinhos leva-me à saída frontal de 6,35mm para auscultadores. Aqui, meus amigos, desculpem-me, mas tive muito poucas horas de audição com auscultadores com o Nait 50. Sou um rapaz calorento, e auscultadores nas orelhas em agosto e setembro, com noites com perto de trinta graus… ninguém merece. Mas ouvi o suficiente para ver (ouvir) que quem se estiver a preparar para investir num Head-amp, pode escolher com algum conforto este Naim, ou se foi um dos avisados que teve o juízo de já o ter adquirido, então se calhar o melhor vai ser guardar o dinheiro que tinha pensado investir no amplificador de auscultadores, e gastar numas colunas melhores. Este Nait 50 parece preparado para se bater com muitos amplificadores dedicados ao áudio pessoal, tanto que os meus Meze 99 Classics, acabaram por se revelar curtos face ao amplificador. Não me interpretem mal, os mesmos auscultadores já se bateram com equipamento de valor superior que passou pela minha sala e não se sairam nada mal. E também por isso foram aqueles pelos quais coloquei o meu dinheiro à frente da minha boca. Aqui ficou a sensação que precisava de uns auscultadores pelo menos um ou dois níveis acima dos Classics para poderem fazer jus às capacidades deste Naim. E antes que me perguntem: e então como se porta com um gira-discos? Lamento mas não tive nenhum por cá a funcionar aquando da estadia do Nait 50, por isso não foi possível confirmar ou desmentir as qualidades que têm sido publicitadas por aí.
De qualidades poderia ficar por aqui algum tempo, mas o texto já vai longo e ainda nem falei das colunas e do leitor de CD
Defeitos?,
esta não vai ser fácil!, deixa ver… o LED branco, nas audições noturnas, poderá ser considerado demasiado brilhante (aqui estarei a ser picuinhas).
Na minha opinião também se deve evitar casar este conjunto com fontes que produzam agudos demasiado brilhantes, em sessões de audição muito longas, pelo menos para mim que tenho muita sensibilidade nesta gama. Os médios-altos podem tornar-se um pouco cansativos, para os meus ouvidos. O meu DAC, importado diretamente da China, tem este defeito, ou feitio. Daí o bom casamento com o CD5si, na minha opinião.
Isto leva-me ao Naim CD5si.
Sou advogado das qualidades dos CDs, e acredito que o formato irá renascer, até porque nem terá efetivamente morrido. Não como formato dominante como já foi, mas como formato alternativo ao vinil, a ponto de se lhe poder juntar na tendência de renascimento, não só com a comunidade audiófila pura, mas também com a malta que aprecia ser um formato palpável e características práticas. Também graças a máquinas como este Naim.
Antes de ter a oportunidade de ouvir o CD5si. Esteve cá em casa um outro leitor de outra marca. Ambas as máquinas me deixaram confiante que quem quiser continuar a ouvir CDs, está cada vez melhor servido no hardware disponível.
O Naim CD5si é um leitor da velha guarda, que demonstrou uma personalidade em linha com o irmão Nait 50 da mesma marca. Com um som exuberante mas linear, de certa forma adocicado nos agudos. Com palco marcadamente mais tridimensional (profundo) e ligeiramente mais largo que o DAC residente. Os baixos com mais nuances e textura, e “amigos” da gama média. O EP de DJ Shadow “What Does Your Soul Look like” foi reproduzido com a aura psicadélica de que me lembro quando o comprei nos anos 90. Apesar da boa definição e delineação dos micro e macro detalhes que este leitor permite, os samples de filmes e séries televisivas, que em outros leitores, parecem por vezes descolados do resto da música, aqui, no CD5si tudo parece ter lógica e continuidade.
Dinâmica e pujança também são qualidades deste leitor, basta ouvir “Carmina Burana” de Carl Orff para o comprovar. Ouvir “Guia espiritual” dos Três Tristes Tigres, trás para a frente a riqueza tonal nem sempre evidente nesta gravação.
O detalhe está lá, mas não será a maior das suas qualidades. O CD5si leva a taça no campeonato da música consumida com entusiasmo, tal e qual o irmão Nait 50.
As colunas, além de equipamento de reprodução de som, são indesmentivelmente, peças de decoração.
Ao contrário de qualquer outro componente, não as podemos esconder, nem que o quiséssemos. Terão de estar sempre expostas. E neste campo, embora gostos sejam sempre relativos, gostei muito das Vestia Nº1. E normalmente não aprecio colunas em preto piano. Estas Focal foram-me enviadas precisamente neste acabamento, mas a superfície polida reside apenas nas laterais, com pele (vegan) na mesma cor, agradável ao toque, na frente, topo e traseira. Toda esta escuridão é contrabalançada com os cones de slatefibre cinza, com o tom metálico dos tweeters e círculo metálico polido exterior ao woofer.
Passando ao mais importante, o som.
As colunas confirmaram a personalidade entusiasmaste dos Naim presentes. Comparei com as Triangle Borea 03, que já de si são emotivas, mesmo com amplificadores contidos. Aqui claro, soltaram claramente a passarinha. E emoção e entusiasmo não faltou no casamento das Borea com €2500 euros de control de ressonância por baixo, com o Nait 50. O mesmo aconteceu com as Vestia Nº1, mas com um pouco mais de elegância e requinte.
O PRaT nas Vestia destacou-se. Estou a lembrar-me de ouvir Bob Marley e de como o timing das secções rítmicas pareceu mais natural, mais reggae!
Estas colunas irão mostrar a gravação como ela é. O que é muito apreciado por muitos, especialmente os que ouvem apenas gravações pristinas.
Eu? ouvi coisas assim-assim. Como “Tubular Bells” de Mike Oldfield. Aqui as Focal mostraram as coisas como elas são. Quem não estiver para aí virado, será melhor procurar algo como as Dynaudio Emit 20 que estiveram aqui há coisa de um mês, que me pareceram mais simpáticas para gravações mais “agrestes”.
Quanto ao palco sonoro, custou chegar à posição, mas quando lá cheguei, o esforço foi recompensado com a imagem mais nítida e focada das colunas que por cá estiveram nos últimos tempos.
A maior qualidade destas Focal é dar um cheirinho de aquilo que tenho ouvido por aí nesses eventos High-end com colunas de muitas dezenas de milhar de euros ou mais. Não me acredito em tomba-gigantes. Não se deixem iludir com discursos de equipamentos que derrotam outros do dobro do preço. Isso não existe. Se estas colunas custam novecentos euros, soam a colunas de novecentos euros! Mas,… existem equipamentos que cumprem muito bem essa ilusão, e para os meus ouvidos, na minha sala, casadas com o Nait 50, estas Vestia Nº1 cumpriram a ilusão.
E eu, voltei à minha adolescência?
O meu cabelo está a cair. O pouco que ainda resta está a perder a cor. Já me deitei na mesa cirúrgica mais vezes que alguns se deitaram com mulheres diferentes… mas sim, claro que sim. Por momentos esqueci o garfo nas costas, e abanei o capacete como se não houvesse amanhã, pelo menos até a filha mais velha aparecer, adolescente, e me fitar com aquele olhar de “pronto, foi desta que fritou a pipoquinha!”
O equipamento presente nesta review foi cedido pela Esotérico