We DO NEED another hero! RAAL Requisite CA-1a, com McIntosh MHA200
Nós, amantes de música, somos crentes. Nunca desistimos de procurar um novo “herói”. O tal equipamento que nos leve ao nirvana musical. Que quebre as noções de reprodução musical que tínhamos até então.
Lembram-se de uma música de Tina Turner da banda sonora de Mad Max, aquele Mad Max das planícies australianas, dos motores V8 e do Mel Gibson ainda sem tiques de vedeta? Chama-se “We Don’t Need Another Hero”.
O fetiche pelo apocalipse tem sido uma constante cinematográfica, e não será por acaso. Secretamente, ou de forma mais ou menos aberta, muitos sentem uma adoração por estes cenários.
O design do amplificador de auscultadores MHA200 da McIntosh insere-se perfeitamente num cenário destes. Na frente, em baixo, estão as tomadas XLR, canal esquerdo, direito ou estéreo, e jack para os auscultadores mais convencionais. Imediatamente acima, na frente chanfrada, à esquerda, o botão de seleção da impedância dos auscultadores, o LED indicador de Stand-by ou On e o botão de ligar e desligar ao centro, e à direita, o botão de regulação do volume, de trato muito (muito) delicado. Em cima, na configuração tradicional McIntosh, do lado esquerdo, está a caixa que abriga os transformadores, que serão os principais responsáveis pelos 5 kg deste pequeno peso pesado, e à direita, as 4 válvulas com as tradicionais luzes verdes da McIntosh. Este amplificador vem fornecido com uma jaula de proteção para as válvulas. Do lado direito, a também tradicional logomarca “McIntosh”. Atrás, além dos dois pares de tomadas, uma balanceada e uma single-ended, temos a tomada para o cabo de corrente.
Os auscultadores CA-1a de fita, ou Ribbon em inglês, da RAAL Requisite, poderiam muito bem ter sido usados pelo piloto de um Sherman ou de um Panzer na 2ª Guerra Mundial. Os materiais com que estes CA-1a são fabricados transpiram durabilidade, mas o acabamento gosta de aparentar ser rudimentar. Não porque o pessoal da RAAL não soubesse fazer melhor, mas porque assim quiseram que fosse. Trata-se de um statement. Aliás, toda a experiência proporcionada por estes auscultadores, desde a abertura da caixa tipo militar à prova de água, passando pelos acabamentos e design industrial, até ao som que debitam, tenta até à sua última célula entregar uma experiência visceral, pura, sem filtros. E conseguem. Se for belo, entregam a beleza em todo o seu esplendor. Se for feio, atiram a fealdade sem medo nem pena das consequências!
Os CA-1a chegaram fornecidos com um transformador toroidal externo de impedância em forma de tijolo, para alimentar o apetite extremo destes CA-1a por corrente elétrica. Estes RAAL podem ser esfomeados, mas entregam música de forma enérgica!
Instalar-se num espaço, pequeno ou grande, e desfrutar do grande prazer que é “beber” a música com estes auscultadores, é abrir o compêndio dos adjetivos audiófilos e começar a distribuí-los. Mas, acima de tudo, tentar conter a energia que passa pelos ouvidos para o corpo, e não esquecer que estamos presos a um cabo, para não trazer o equipamento atrás de nós num movimento mal calculado.
Cheguei a ter as minhas dúvidas se iria conseguir devolver o conjunto inteiro. Exemplo: ouvir o rock de “Today” dos Smashing Pumpkins com os RAAL e um cabo tão curto é um caso sério de risco à integridade estrutural do transformador e do amplificador de auscultadores que o acompanha.
Vamos tirar já isto do caminho: estes RAAL Requisite são dos melhores auscultadores que já experimentei!
Voltando a Mad Max… estes RAAL pedem Duran Duran! “Wild Boys”. Anos 80. Que ataque! Se eu disser que o som destes auscultadores tem pelos no peito, compreendem, não compreendem? Eu sabia que sim!
Certo, há pouco mais de um ano estiveram por cá os Meze Elite, também do campeonato High-end. Também os apreciei. E comparar os dois com base na memória do que ouvi há 12 meses de distância seria no mínimo desonesto da minha parte. Mas, levando em conta que não me recordo de os anteriores me criarem tamanha reação, e logo no primeiro momento, posso arriscar dizer que estes RAAL são sérios candidatos a surpresa do ano. Certo também! O amplificador de auscultadores que a Ajasom enviou para testar estes muito especiais auscultadores também não é de se deitar fora, muito pelo contrário. Este conjunto não promete, cumpre.
O que é que andei a ouvir? Algumas músicas saíram da playlist da Ajasom no Qobuz.
As cordas da guitarra que acompanha Rosalia em “Que se Muere Que se Muere” parecem estalar, tal a velocidade do ataque de cada nota.
“All in Good Time” ao vivo, Dead Can Dance, é reproduzido como esta banda merece ser sempre ouvida, com escala, com o som do tamanho de uma orquestra, e com a reverberação fiel ao espaço ao vivo onde decorreu a atuação. É a sensação que transmitiu.
A cada instrumento da Boston Symphony Orchestra é dado o direito a brilhar na 4ª Sinfonia de Shostakovitch tal é a separação e detalhe. Com escala e grandiosidade, ou imediatamente a seguir, delicada filigrana sonora, sem pestanejar.
A voz de Moses Sumney em “To Believe”, Cinematic Orchestra, é deliciosa e contrasta de certa forma com as notas graves do teclado. O chão não abanou, só porque se trata de auscultadores, mas os maxilares apertaram no crescendo da secção de cordas final.
Os graves são qualquer coisa! Pujança, textura, rápidos e com uma enorme escala. Ouça-se “24 Hours” de Tom Jones. Não estava nada à espera, face à tecnologia usada.
Sim, o primeiro impacto nestes CA-1a foram os graves, como nunca tinha ouvido em auscultadores, uma surpresa absoluta pela tecnologia utilizada. Juntaram-se o ataque, a dinâmica e a escala quase avassaladora. O pormenor, as finas texturas sonoras e o palco sonoro largo e profundo como não achava possível em headphones, e a forma orgânica como reproduziu as vozes. Ouça-se a voz deliciosa e emotiva (como sempre neste intérprete) de Antony Hegarty em “In This Shirt” (Royksopp remix), de The Irrepressibles.
Outro grande desafio cumprido, “Soyeusement” de Michel Godard. A música foi gravada, com uma enorme reverberação, original da sala. Reproduzi-lo é complicado num sistema encabeçado por colunas, mas mais difícil se torna atingir esta profundidade com auscultadores. Desafio ultrapassado, e com distinção.
Todo este jargão audiófilo é muito bonito e interessante. Não faltam por aí equipamentos que também são compêndios de adjetivos, mas em alguns parece faltar o cimento que aglomere essas qualidades, o que de pouco ou nada vale. Não foi o que ouvi aqui. Aqui, ouvi música que me mexeu por dentro. Que me fez mexer por fora (com cuidado, porque o cabo não era longo e queria devolver tudo inteiro).
A música tem de nos marcar na pele, senão não vale a pena. Estes RAAL Requisite mexeram comigo, e faço o Pepsi Challenge com qualquer um, garantindo que não deixarão ninguém indiferente.
Defeitos ou questiúnculas (até porque nada é perfeito)
Eu não me importei, mas poderá haver quem ache que uns auscultadores que necessitam de se ligar a um energizador, por sua vez ligado a um amplificador, que por sua vez necessita de uma fonte, possam ser demasiado arsenal. No entanto, o preço pedido destes auscultadores, logo à partida, só atrairá apreciadores determinados a poderem apreciar música desta forma, e que possam desembolsar: €2400 nos CA-1a, e se escolherem o MHA200, mais €4200.
O MHA200 podia ter um botão de volume que oferecesse um pouco mais de resistência. Quem não conhecer, à primeira pode “escorregar” e rebentar os tímpanos. Outra coisa que não aprecio é a chapa frontal em metal polido, que inevitavelmente ficará com dedadas.
Considero tudo isto mais que ultrapassável para quem quer ter o direito de desfrutar deste conjunto em casa. O que eu aconselho para esquecer este escriba que tem a mania de ser tinhoso? Solicitar uma audição. Para quem o fizer, atenção, os euros irão escorregar para fora da conta bancária, pois irá faltar a força para contrariar a vontade de os possuir.
No final disto tudo, resumindo e concluindo, chegamos à pergunta: precisamos de um novo herói?
Precisamos, sim. Precisamos de heróis assim. Nem que se tratem de equipamentos eletrónicos. Porque precisamos de música. De música tocada assim
Equipamento usado nesta análise
- RAAL Requisite CA-1a, true ribbon headphones, disponíveis em Ajasom
- McIntosh MHA200, valve headphone amplifier, disponivel em Ajasom
- MoFi StudioDeck, turntable, disponível em Ultimate Audio
- Rothwell Simplex, phono stage, disponível em Autumn Leaf Audio
- Eversolo DMP-A6 Master Edition, streamer, disponível em Esotérico
- Denon DNP-2000NE, streamer, disponível em Smartaudio
- cables & power distributor: Ansuz, disponível em Autumn Leaf Audio